top of page
O surgimento do Espiritismo

Os relatos da comunicação entre os vivos e os espíritos das pessoas que já morreram remontam às épocas mais antigas e podem ser encontrados em todos os países e nas mais diferentes culturas. O caso das irmãs Fox, ocorrido no ano de 1847, nos Estados Unidos, foi o mais famoso e um dos primeiros e mais bem documentados nos tempos modernos, e inclusive deu origem às pesquisas que culminaram com o surgimento do Espiritismo.

Através da divulgação deste fenômeno nos Estados Unidos, os fenômenos espíritas nos salões da Europa tornarem-se populares, quando então Allan Kardec, através de seus estudos e pesquisas, lançou a codificação da Doutrina Espírita.

Em 11 de dezembro de 1847, a família Fox, de origem canadense, instalou-se em uma casa modesta na povoação de Hydesville, no estado de Nova Iorque, Estados Unidos. O grupo compunha-se do chefe da família, Sr. John D. Fox, da esposa Sra. Margareth Fox, suas duas filhas: Kate, com 11 e Margareth, com 14 anos de idade e também outro filho chamado David. O casal possuía também mais filhos e filhas. Entre estas, Leah, mais velha, que morava em Rochester, cidade 30 km distante de Hydesville.

 

 

 

 

 

 

 

Irmãs Fox: Kate, Margareth e Leah

No início, os Fox não sofreram nenhum incômodo em sua nova residência. Entretanto, nos dois primeiros meses de 1848, passaram a ser incomodados por sons de pancadas,  vibrações no forro da sala, assoalho, paredes e móveis. As meninas ficaram assustadas e passaram a dormir no quarto dos pais.

A princípio a família não acreditava que aqueles ruídos tivessem uma origem sobrenatural e procuravam localizar uma causa natural para os mesmos. Posteriormente, no entanto, conseguiram estabelecer um sistema de comunicação através do qual faziam perguntas e o autor das pancadas respondia.  A fonte mais conhecida e divulgada sobre este caso é o depoimento da Sra. Margareth Fox que consta no livro “História do Espiritismo” de Sir Arthur Conan Doyle:

"Na noite da primeira perturbação, todos nos levantamos, acendemos uma vela e procuramos pela casa inteira, enquanto o barulho continuava e era ouvido quase que no mesmo lugar. Conquanto não muito alto, produzia um certo movimento nas camas e cadeiras a ponto de notarmos quando deitadas. Era um movimento em trêmulo, mais que um abalo súbito. Podíamos perceber o abalo quando de pé no solo. Nessa noite continuou até que dormimos. Eu não dormi até quase meia-noite. Em 30 de Março nós éramos perturbados todas as noites. Os ruídos eram ouvidos por quase toda a casa. Meu marido ficou à espera, fora da porta, enquanto eu me achava do lado de dentro, e as batidas vieram da porta que estava entre nós. Ouvimos passos na copa, e descendo a escada; não podíamos repousar, então conclui que a casa deveria estar assombrada por um espírito infeliz e sem repouso. Muitas vezes tinha ouvido falar desses casos, mas nunca tinha testemunhado qualquer coisa no gênero que eu não pudesse explicar antes.

Na noite de sexta-feira, 31 de março de 1848, resolvemos ir para a cama um pouco mais cedo e não nos deixarmos perturbar pelos barulhos, para tentar ter uma noite de repouso. Meu marido estava aqui em todas essas ocasiões, ouviu os ruídos e ajudou na busca. Naquela noite fomos cedo para a cama – tinha acabado de  escurecer. Achava-me tão esgotada e sem repouso que quase me sentia doente. Meu marido não tinha ido para a cama quando ouvimos o primeiro ruído naquela noite. Eu tinha acabado de deitar. A coisa começou como de costume. Eu o distinguia de quaisquer outros ruídos jamais ouvidos. As meninas, que dormiam em outra cama no quarto, ouviram as batidas e procuraram fazer ruídos semelhantes, estalando os dedos.

Minha filha menor, Kate, disse, batendo palmas: "Senhor Pé-Rachado, faça o que eu faço". Imediatamente seguiu-se o som, com o mesmo número de palmadas. Quando ela parou, o som logo parou. Então Margareth disse brincando: "Agora faça exatamente como eu. Conte um, dois, três, quatro" e bateu palmas. Então os ruídos se produziram como antes. Ela teve medo de repetir.  Então Kate disse, na sua simplicidade infantil: "Oh! mamãe! eu já sei o que é. Amanhã é dia primeiro de abril e alguém quer nos pregar uma mentira".

Então pensei em fazer um teste que ninguém seria capaz de responder. Pedi que fossem indicadas as idades de meus filhos, sucessivamente. Instantaneamente foi dada a exata idade de cada um, fazendo uma pausa suficientemente longa de um para o outro, a fim de os separa-los até o sétimo, depois do que se fez uma pausa maior e três batidas mais fortes foram dadas, correspondendo à idade do menor, que havia morrido, que era meu filho mais novo.

Então perguntei: "É um ser humano que me responde tão corretamente?" Não houve resposta. Perguntei: "É um Espírito? Se for dê duas batidas." Duas batidas foram ouvidas assim que fiz o pedido. Então eu disse: "Se foi um Espírito assassinado dê duas batidas". Estas foram dadas instantaneamente, produzindo um tremor na casa. Perguntei: "Foi assassinado nesta casa?" A resposta foi como a precedente. "A pessoa que o assassinou ainda vive?" Resposta idêntica, por duas batidas. Pelo mesmo processo verifiquei que ele fora um homem de 31 anos de idade, que tinha sido assassinado nesta casa e os seus despojos foram enterrados na adega; que a sua família era constituída de esposa e cinco filhos, dois rapazes e três meninas, todos vivos ao tempo de sua morte, mas que tinha morrido depois. Eu perguntei: Você continuará a responder se eu chamar meus vizinhos para que eles possam ouvir também? Duas batidas altas vieram como resposta afirmativa”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Casa da família Fox em Hydesville

Logo após desenvolver este sistema de comunicação com o autor dos ruídos, ainda assustados, os Fox chamaram todos os seus vizinhos, que também passaram a presenciar o fenômeno e a fazer perguntas, as quais eram prontamente respondidas com precisão absoluta, convencendo até os mais incrédulos. Nos dias que se seguiram, os rumores destes fenômenos propagaram-se rapidamente atraindo uma multidão de pessoas.

Posteriormente, através de uma combinação alfabética das pancadas produzidas, chegou-se à identidade da entidade que estava produzindo as mesmas. Tratava-se de um mascate chamado Charles B. Rosma que, quatro anos antes, havia sido assassinado naquela residência pelo inquilino e enterrado na adega. Algumas escavações foram feitas no local, porém a princípio nada foi encontrado. No verão de 1848 o próprio filho dos Fox, David, retomou o empreendimento, realizando escavações a uma profundidade de um metro e meio, quando então foram encontrados cabelos e alguns fragmentos de ossos, que foram reconhecidos por um médico como pertencentes a um esqueleto humano. Porém, devido à precariedade das provas, nenhuma atitude foi tomada com relação à investigação criminal do caso.

As duas garotas, Margareth e Kate, foram afastadas de casa, pois se suspeitava que os fenômenos estivessem ligados à sua presença. Margareth passou a morar com seu irmão David Fox e Kate mudou-se para a casa de sua irmã Leah na cidade de Rochester. Contudo, os fenômenos acompanharam as irmãs Fox. Onde quer que elas estivessem, os ruídos ocorriam.

As irmãs Fox acabaram sendo então as criadoras de um “movimento espiritualista” que veio, mais tarde, espalhar-se por todo o mundo. Elas passaram aproximadamente 10 anos realizando apresentações de seus “poderes mediúnicos”. Em 1858, por conta de seus casamentos, Margareth e Leah retiraram-se do movimento, ficando apenas Kate.

No ano de 1870, um renomado cientista da época, Sir William Crookes, fez vários experimentos com Kate e concluiu que ela realmente possuía várias capacidades mediúnicas. Relatou Crookes: “Com pleno conhecimento das numerosas teorias que foram apresentadas antes, sobretudo na América, para explicar esses sons, experimentei-os de todas as maneiras que pude imaginar, até não mais ser possível furtar-me à convicção de que eram bem reais e que não se produziam pela fraude ou por meios mecânicos."

Ao final da década de 1880, Kate e Margareth desentenderam-se e, decidida a macular a imagem da mais velha, Margareth publicou longa crítica ao Espiritualismo, culpando Leah por uma suposta manipulação de tudo o que se passava. Ansiosas para prejudicarem Leah o tanto quanto possível, no mês seguinte Margaret e Kate viajaram para Nova York, onde um repórter ofereceu 1.500 dólares para elas afirmarem publicamente que fraudavam os fenômenos de alegadas comunicações com espíritos.

No entanto, um ano após as denúncias de supostas fraudes, Margareth decidiu desmentir as suas "confissões", alegando tê-las feito em troca de dinheiro oferecido por religiosos que se aproveitaram de sua situação de pobreza e desejavam desacreditar o movimento espiritualista.

Foi somente em Novembro de 1904, passados 56 anos do início da ocorrência dos fenômenos, que o esqueleto do mascate assassinado na residência dos Fox foi finalmente encontrado.

 

Conforme notícia publicada no dia 3 de Novembro de 1904 pelo Boston Journal, meninos de uma escola estavam brincando na adega da antiga casa quando então, em meio aos escombros de uma parede que existia na adega, encontraram as peças de um esqueleto humano. Junto ao esqueleto foi encontrada uma lata de uma espécie costumeira usada por mascates.

 

 

Allan Kardec, o codificador do Espiritismo

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Os fenômenos ocorridos em Hydesville foram um dos mais documentados e estudados fenômenos de manifestação espiritual, tendo sua autenticidade sido comprovada por cientistas e estudiosos das ciências psíquicas da época. A partir destes fenômenos, espalharam-se pelo mundo todo as tentativas de comunicação com o mundo invisível e popularizaram-se as chamadas “mesas girantes”.

Neste sistema, as pessoas sentavam-se ao redor de uma pequena mesa e colocavam as mãos espalmadas sobre ela. Passado algum tempo, a mesa começava a dar sinais de movimento, erguia-se no ar e girava sob as mãos dos que faziam a sessão. Dispondo-se de um círculo ou de um quadro formado pelas letras do alfabeto, podia-se estabelecer um diálogo com a mesa, uma vez que era convencionado que ela desse uma pancada quando fosse apontada uma letra determinada.

 

 

 

 

 

 

 

 

As reuniões das “mesas girantes” virou moda nos Estados Unidos e em seguida na Europa. Em 1852, eram comuns os convites para reuniões elegantes, na Inglaterra, onde, após o chá, os convivas se divertiam consultando as mesas girantes. Evidentemente, naquele momento, tais reuniões eram movidas principalmente por “curiosidade” e “diversão” e não por um desejo de aprendizado e pesquisa.

Com o passar do  tempo, no entanto, o fenômeno das mesas girantes foi diminuindo de popularidade e passou a ser motivo de anedotas, devido às muitas fraudes que eram praticadas por médiuns famosos na época. O próprio Harry Houdini, um dos mais famosos ilusionistas da época, desmascarou vários destes médiuns, expondo os truques que eles utilizavam.

 

Porém, por trás do “modismo” e da grande quantidade de fraudes que caracterizaram o evento das mesas girantes, havia um fenômeno real, que chamou a atenção de Hippolyte Léon Denizard Rivail, um importante autor e educador Francês, membro destacado de diversas sociedades científicas, que mais tarde usaria o pseudônimo de Allan Kardec.

 

O Professor Rivail ouviu pela primeira vez falar do fenômeno das mesas girantes em 1854. Porém, como estudioso da hipnose, do magnetismo e da eletricidade, ele já possuía uma opinião formada para tais fenômenos: Segundo ele, os corpos reunidos em tais reuniões geravam uma força eletromagnética extremamente forte, capaz de movimentar objetos. Porém, quando finalmente veio a conhecer o fenômeno pessoalmente, percebeu que a explicação não era assim tão simples.

Quando começou a frequentar tais reuniões, percebeu que, por trás do fenômeno, havia uma causa inteligente. Foi então que iniciou uma pesquisa profunda sobre os fenômenos invisíveis que vieram a dar origem ao Espiritismo.

Allan Kardec desenvolveu um método específico de investigação experimental dos fenômenos espíritas, uma vez que o método das ciências naturais não poderia investigar, tampouco demonstrar a existência do mundo espiritual. Em seu método de pesquisa, aplicou o método de experimentação, segundo suas próprias palavras: “...jamais formulei teorias preconcebidas; observava acuradamente, comparava, tirava consequências; procurava, pelos efeitos, atingir as causas através da dedução, pelo encadear lógico dos fatos, não aceitando como válida uma explicação, a não ser quando ela pudesse resolver as dificuldades da questão.” ("Biografia de Allan Kardec" - Henri Sausse)

Através de suas pesquisas sérias, imparciais e minuciosas, Allan Kardec chegou à conclusão de que existiam inteligências invisíveis comunicando-se, ou seja, os “espíritos” dos mortos podiam comunicar-se com o mundo dos vivos. E a existência desta comunicação provava a existência de um mundo invisível, uma dimensão paralela à nossa, sobre a qual a ciência oficial ainda não tinha nenhum conhecimento.

Em Agosto de 1855, começou a coordenar uma equipe de médiuns, aos quais passou a submeter um conjunto de perguntas e respostas de diversos temas por ele desenvolvidos, as quais os espíritos, através dos mesmos, deveriam responder. Kardec submeteu este trabalho a um controle bastante rígido, tanto com relação à escolha dos médiuns, que deveriam ser pessoas “insuspeitas”, de reconhecidas qualidades morais, quanto com relação à análise das comunicações do ponto de vista lógico. Outro recurso utilizado por Kardec era o “consenso universal”, ou seja, a concordância de várias comunicações, recebidas por médiuns diferentes, ao mesmo tempo e em lugares diferentes, sobre o mesmo assunto.

Assim, em 1857, Kardec lançou a primeira edição de “O Livro dos Espíritos”, que continha 501 perguntas e respectivas repostas dos espíritos sobre diferentes temáticas, tais como Deus, o universo, os espíritos, a reencarnação e as leis que regem o mundo espiritual. Em sua segunda edição, em 1860, o livro passou a trazer 1019 perguntas. Kardec veio a lançar posteriormente outros 4 livros: “O livro dos médiuns” (1861), “O Evangelho segundo o Espiritismo” (1864), “O céu e o inferno” (1865) e “A Gênese” (1868). Estes 5 livros constituem a chamada “codificação espírita” e são a  base do Espiritismo.

Embora tenha surgido na França, foi no Brasil que o Espiritismo se consolidou e hoje cresce de forma vertiginosa. O numero de livros espíritas publicados no Brasil é extraordinário. O médium espirita brasileiro mais importante, Chico Xavier, psicografou mais de 400 livros, tendo sido vendidos mais de 45 milhões de exemplares!

Um dos diferenciais do Espiritismo em relação a outras doutrinas é que ele tem um caráter científico, filosófico e religioso. No livro “A Gênese”, Kardec destaca a proposta espírita de caminhar ao lado das descobertas científicas: ”O espiritismo, marchando com o progresso, jamais será ultrapassado porque, se novas descobertas demonstrassem estar em erro sobre um certo ponto, ele se modificaria sobre esse ponto; se uma nova verdade se revelar, ele a aceitará”.

 

Portanto, o Espiritismo não sustenta “dogmas inquestionáveis”, nem teme debater quaisquer dos pressupostos que lhe servem de embasamento. Pelo contrário, anda lado a lado com a ciência. O “Livro dos Espíritos”, lançado em 1857, continua atual até hoje. O que observamos é que, à medida que a ciência evolui, cada vez mais se fortalecem as evidências que demonstram a existência da vida após a morte, da comunicação com espíritos e da Reencarnação.

bottom of page